Wayne Gretzky e a troca que chocou a NHL
Há quase 32 anos, Greztky deixava os Oilers e seguia para os Kings, e ninguém entendeu nada!
Nove de agosto de 1988. Foi a data em que o melhor jogador de hóquei de todos os tempos foi trocado.
Em um anúncio feito pelo dono do Edmonton Oilers na época, Peter Pocklington, o mundo soube que uma negociação entre o time canadense e os Los Angeles Kings tinha sido concretizada. Junto com Marty McSorley e Mike Krushelnyski, Gretzky se tornava um jogador dos Kings, que em troca, mandava Jimmy Carson, Martin Gelinas, três escolhas de primeira rodada no Draft da NHL (1989,1991,1993) e US$ 15 milhões.
Antes de entrarmos na negociação em si, é importante contextualizar o que era a NHL naquele momento. A década de 80 viu o surgimento de uma dinastia feita pelo New York Islanders, que conquistou quatro títulos seguidos (1980,81,82,83) e que foi substituída pelos Oilers, que conquistaram a Stanley Cup em 84, 85, 87, 88. Foi uma década dividida em dois grupos fantásticos, que dominaram o esporte.
Exceto uma derrota para o Calgary Flames na final da conferência em 86, os Oilers eram sinônimos de vitórias. A cidade respirava hóquei, e Wayne Gretzky era o melhor jogador daquela equipe, que tinha diversos craques que viraram lendas, como Mark Messier, Kevin Lowe e Grant Fuhr. A franquia entrou na NHL em 1980, e já brilhava por causa de um menino chamado Gretzky.
Ao final da temporada 1987-1988, com mais um título no bolso, os Oilers curtiam as férias mas a gerência da franquia ainda tinha uma missão para concluir. O contrato de Gretzky chegaria ao fim em junho de 1989 e ele se tornaria um agente livre no mercado. O treinador do time, Glen Sather, não cogitava a ideia de perder o maior craque da franquia sem receber nada em troca em fim da temporada. O próprio Gretzky, em conversa com Messier, seu melhor amigo no time, afirmou que não iria deixar Edmonton.
Mas durante 87-88, os Oilers procuraram o jogador para uma renovação diversas vezes e a resposta foi a mesma. “Não quero conversar agora, meu foco é em ganhar a Stanley Cup.”. Se Sather confiava na permanência, Pocklington era mais cético. E o medo de perder Gretzky para uma maior oferta de outro clube era real na cabeça do dono do time. Importante ressaltar que na época a NHL não tinha o teto salarial, que chegou à liga apenas em 2005-2006.
Apesar dos títulos, Edmonton não era um dos maiores centros do esporte e isso causava uma diferença de competitividade financeira grande. E não só isso. As finanças de Pocklington não estavam boas. Sócio de inúmeros negócios como restaurantes, fábrica de óleo de canola e carne de frango, o empresário conseguiu um empréstimo de US$ 55 milhões com bancos em Alberta para uma nova fábrica de processamento de alimentos, que nunca saiu do papel. Acumulavam-se dívidas e mais dívidas no portfólio do dirigente.
Outro aspecto no cenário era a vida pessoal de Gretzky. Recém-casado com a atriz Janet Jones, que morava e trabalhava em Los Angeles, a nova vida de casado seria muito mais facilitada se ambos estivessem em LA. Rumores que a esposa tentava influenciá-lo para jogar na Califórnia eram cada dia maiores. Mas a história contada pelo próprio Gretzky desmente tudo isso. “No final das contas, os Oilers me disseram que eu tinha três opções. Nova York, LA e Detroit. Para onde você quer ir? Todos acham que a Janet queria que eu fosse para Los Angeles, mas ela disse Detroit.”, disse Gretzky, em entrevista para a CBC.
Pelo lado dos Kings, uma grande mudança tinha acabado de acontecer. O lendário Jerry Buss era o dono do time, e também comandava os Lakers, na NBA. Em 1987, Buss vendeu o time de hóquei para Bruce McNall, que fez fortuna na cidade produzindo filmes em Hollywood. Interessado em causar impacto e colocar os Kings no mapa do hóquei, o empresário foi atrás do melhor jogador do planeta.
Com a temporada 87-88 chegando ao fim, os rumores sobre Gretzky só aumentavam. O deputado canadense Nelson Riis chegou a elaborar um projeto de lei impedindo que o astro jogasse por outro time que não fosse do Canadá. E em julho, muito se especulava sobre uma ida da lenda para o Vancouver Canucks.
Uma história contada pelo Edmonton Journal pode ter sido definitiva para a troca. Com Gretzky passando férias em LA, McNall o convida para o seu escritório. De lá, ele liga para Pocklington e coloca a conversa em viva voz. O dono dos Oilers, ao ser perguntado sobre o camisa 99, começa a falar mal no jogador. Mimado, desagregador e “comandado pela Janet” foram alguns dos adjetivos usados.
Irritado, Gretzky teria dado o sinal verde para McNall fazer o negócio. A negociação começava pra valer. O dono dos Kings conversava direto com Pocklington, ambos não usaram seus general managers ou treinadores. Na noite do dia 8 de agosto, a troca estava confirmada. Gretzky soube mediante um telefonema de McNall, informando-o do negócio e da entrevista coletiva marcada para o dia seguinte, em Edmonton. Ambos estavam em LA e iriam juntos, no jato particular do empresário para o Canadá.
Manhã de 9 de agosto, entrevista coletiva no Edmonton Molson House completamente lotado. Antes de entrarem na sala principal, Pocklington e Sather chamam Wayne Gretzky para uma sala anexa. Relembrando o dia, McNall achava que o negócio iria ser cancelado. Os dois dirigentes dos Oilers disseram a Gretzky que se ele quisesse, cancelavam tudo. “The Great One” manteve a posição, informando que todos os participantes do negócio já tinham dado a sua palavra.
Após a fala de Pocklington, Gretzky senta-se na mesa em frente os microfones e praticamente não consegue falar ou responder a qualquer pergunta. O choro do craque deixa a todos atônitos, que após alguns minutos, começam a aplaudir o jogador. Ele deixa a mesa, senta-se no fundo da sala, sem conter as lágrimas.
Pocklington virou inimigo número 1 de toda a cidade de Edmonton. Na primeira temporada sem Gretzky, os Oilers ainda foram eliminados pelos Kings na primeira rodada dos playoffs. A recuperação veio na temporada seguinte, com o título, último conquistado pela franquia, e sem o ídolo.
Wayne Gretzky virou recordista de quase tudo na NHL, mas não conseguiu levar mais uma Stanley Cup, apesar de ter chegado às finais em 1993 com o time de Los Angeles.
Patrick Roy, goleiro lendário da NHL, foi negociado pelo Montreal Canadiens para o Quebec Nordiques (atual Colorado Avalanche) e foi o primeiro que disparou a frase que ficou conhecida em toda liga. “Se até o Gretzky foi trocado, qualquer um pode ser também.”
(Fotos: Bruce Bennett Studios via Getty Images Studios/Getty Images; NHL.com)