Valem mais? Le’Veon Bell expõe situação dos running backs na NFL
Offseason segue marcada por disputas contratuais, e situação de Bell demonstra desvalorização de contratos dos RBs
Le’Veon Bell e o Pittsburgh Steelers voltaram a entrar em rota de colisão durante esta offseason devido a uma nova negociação de contrato. E, pelo segundo ano consecutivo, jogador e franquia não chegaram a um acordo definitivo, o que fará com que o running back atue por mais uma temporada sob a franchise tag.
O episódio envolvendo Bell foi mais um entre muitos de uma offseason marcada por disputas contratuais. Aaron Donald, Julio Jones, Earl Thomas, Khalil Mack e até o novato Roquan Smith não se apresentaram para os training camps dos respectivos times em função de negociações de contrato.
A questão é extremamente complexa. Embora o caso de Bell apresente alguns fatores específicos para running backs, o astro dos Steelers é um dos principais expoentes que ajuda a revelar o “elephant in the room“: a possibilidade de um lockout é cada vez maior. Por outro lado, é justamente dentro desse cenário que outros jogadores da posição passam a ter esperança de assinar acordos mais vantajosos.
(Foto: Jim Rogash/Getty Images)
O ressurgimento dos running backs: valorização em campo, desvalorização nos salários
Tragédia anunciada, a negociação de Le’Veon Bell teve o mesmo desfecho da última temporada: sem se entender quanto aos valores e à duração de um contrato de longo termo, Bell novamente se encontra sendo o alvo da franchise tag dos Steelers. O running back garantirá US$ 14,5 milhões em 2018, mas será um free agent em 2019.
Vale ressaltar, no entanto, que o salário do jogador dos Steelers para a atual temporada é significativamente maior do que o segundo lugar na lista entre os running backs: de acordo com o site Over the Cap, Devonta Freeman receberá US$ 5 milhões do Atlanta Falcons nesta temporada, e tem média de US$ 8,25 milhões nos seis anos do acordo. Por outro lado, ao contrário de Freeman, Bell não poderá contar com a segurança de um contrato longo em caso de eventuais lesões.
A disparidade salarial revela um problema específico para os running backs: o baixo valor dos contratos com relação aos demais jogadores. A posição voltou a ser destaque nas últimas temporadas, em grande parte graças à chegada de novos nomes: nos últimos três anos, Ezekiel Elliott, Leonard Fournette e Saquon Barkley foram escolhas de top-5 no Draft. A dupla Alvin Kamara e Mark Ingram foi uma das principais responsáveis pela excelente campanha do New Orleans Saints em 2017, enquanto Todd Gurley liderou o ataque de um surpreendente Los Angeles Rams. Apesar da crescente importância em meio a esse ressurgimento, os running backs estão à frente somente de kickers e punters em média salarial.
A durabilidade, evidentemente, surge como o principal empecilho para os atletas da posição: é comum atribuir a chegada aos 30 anos como um “prazo de validade”. Afinal, running backs constantemente são submetidos a contatos de alto impacto, que somados à demanda física natural da posição – a exigência de uma enorme explosão muscular – naturalmente resultam em um número elevado de lesões. Também é comum que running backs atinjam o auge de desempenho por volta dos 26 anos, idade que costumeiramente marca o primeiro grande contrato para as demais posições. Ou seja, há um receio por parte dos donos das franquias em ocupar recursos com um jogador que, teoricamente, entrará em declínio significativo antes de cumprir todo o acordo.
De certa forma, os running backs são obrigados a optar pela segurança de um contrato longo, mas com valor menor. Não foi o caso de Le’Veon Bell: o jogador do Pittsburgh Steelers buscava uma média de US$ 17 milhões anuais. Embora o valor seja próximo da franchise tag, a equipe ainda considera mais vantajoso fechar contratos anuais dentro dessa faixa ao invés de assumir o compromisso do longo termo.
(Foto: Divulgação/Pittsburgh Steelers)
Um novo padrão para contratos de running backs
Mas nem todas as notícias são ruins para os jogadores da posição. Os contratos fechados por novatos nos últimos três anos começam a demonstrar uma tendência de valores maiores. Enquanto Ezekiel Elliott, de acordo com o Over the Cap, tem média anual de US$ 6,24 milhões, Leonard Fournette já recebe US$ 6,78 milhões. Saquon Barkley, por sua vez, parece ter estabelecido em definitivo este novo padrão para running backs: o novato acertou um valor de US$ 31,2 milhões ao longo de quatro temporadas com o New York Giants. Ou seja, talvez haja uma abertura para que running backs passem a negociar contratos longos com valores maiores.
Independente da durabilidade para atletas da posição, a questão dos contratos de running backs expôs um problema muito maior e que atinge toda a NFL: os jogadores buscam uma fatia maior dos faturamentos das franquias.
Todd Gurley revelou parte dessa frustração recentemente: o astro do Los Angeles Rams, que já declarou abertamente o apoio a Le’Veon Bell, comparou os contratos do futebol americano aos de astros da NBA. Embora os elencos do basquete contem com um número significativamente menor de jogadores para dividir o salary cap, os times da NFL apresentam um faturamento anual maior: foram US$ 8 bilhões em 2017.
O atual acordo financeiro (CBA – Collective Bargain Agreement) da liga tem validade até 2021. E aí surge o grande problema por trás de todas as disputas contratuais, não apenas dos running backs.
(Foto: Reprodução Twitter/New York Giants)
Uma NFL fraturada e a real possibilidade de lockout: o que o futuro reserva?
Para a NFL, 2017 passou longe de ser um ano tranquilo: em meio à polêmica envolvendo Colin Kaepernick, a liga foi tomada pelos protestos durante a execução do hino nacional. A NFLPA (Associação de Jogadores da NFL), donos das franquias e o comissário Roger Goodell entraram em rota de colisão. Donald Trump também contribuiu para agravar o problema.
As relações entre a NFLPA e os owners já foi abalada durante a última negociação do CBA: o acordo fechado em 2006 foi rompido pelos proprietários das franquias em 2008. O atual Collective Bargain Agreement, por sua vez, foi acertado em 2011 após um longo processo. De lá para cá, no entanto, o faturamento da liga cresceu substancialmente, de modo que o salary cap passou a representar uma fatia relativamente pequena do total.
Enquanto isso, jogadores passaram a compreender melhor os riscos envolvidos com o esporte e a buscar garantias financeiras durante a carreira já com a aposentadoria em mente. Esse contexto ajuda a compreender melhor os atuais holdouts durante as negociações de contratos maiores.
E é dentro desse complicado cenário que chegamos ao que será o grande problema da NFL nos próximos anos: um novo CBA.
O atual acordo financeiro firmado entre a NFLPA e os donos de franquias expira em março de 2021. Caso os dois lados não cheguem a um novo acerto até lá, a liga estará efetivamente paralisada. Diferentemente da última vez, no entanto, os jogadores parecem mais unidos e dispostos a tomar uma posição firme durante a negociação. Ou seja, um lockout que se arraste até o início da temporada regular tem grandes chances de ocorrer.
O diretor da associação dos jogadores, DeMaurice Smith, já admitiu a possibilidade em uma entrevista realizada em 2017. Citando a falta de confiança dos jogadores nos proprietários das franquias, Smith classificou a chance de um lockout como “virtualmente certa”.
O novo CBA pode apresentar mudanças significativas. Todd Gurley também é uma voz ativa nesse debate. O running back dos Rams acredita que os colegas de profissão devem buscar contratos com valor garantido (vale lembrar que o primeiro contrato com valor integralmente garantido na história da NFL foi assinado neste ano, entre Kirk Cousins e o Minnesota Vikings).
“Considerando o nível de brutalidade, força física e rotatividade, assim como o curto ciclo dos participantes, acredito que os jogadores da NFL necessitam de contratos garantidos”, declarou em entrevista ao site TMZ.
No caso específico dos running backs, é possível que a longa disputa de Le’Veon Bell traga resultados efetivos já durante a negociação do próximo CBA. Com o jogo corrido voltando a ter importância cada vez maior dentro de jogo, juntamente aos altos valores dos contratos de Elliott, Fournette e em especial Barkley, os jogadores da posição podem começar a sonhar com acordos semelhantes aos dos demais atletas de futebol americano.
(Foto: Reprodução Twitter/Los Angeles Rams)