Montando a defesa ideal para a NFL moderna
Por meio de uma análise tática, reunimos num mesmo time os melhores defensores da liga por posição
Semana passada nesta coluna eu escrevi sobre como a NFL tem mudado e focado mais no ataque sobre a defesa nos últimos anos. Como a grande maioria dos amantes do futebol americano, eu adoro uma bela performance ofensiva. Parte do que transforma o jogo nesse esporte magnifico, são os passes de 60 jardas que encontram um WR explodindo em alta velocidade por trás da defesa acertando-o com precisão sobrenatural. Sim, são grandes momentos inesquecíveis que convertem novos telespectadores a amantes do esporte. Porém também há algo especial sobre uma grande defesa, existe uma arte, uma beleza, de um duelo travado entre duas grandes defesas. Nessa semana vamos montar o que no meu ponto de vista é uma defesa perfeita para a NFL moderna.
Toda defesa começa no esquema do front seven, simplificando, 3-4 ou 4-3. São as diferenças drásticas no estilo de jogadores requeridos para vencer a batalha nas trincheiras. Eu sou fã do sistema 3-4, revolucionado por Bum Phillips (pai de Wade Phillips, coordenador defensivo do Los Angeles Rams) com o lendário Bear Bryant. O sistema 3-4 traz mais versatilidade na pressão criada em blitzes pelos jogadores de linha. Algumas das minhas defesas prediletas jogaram nesse sistema: Broncos de Phillips, Giants de Parcells e os Ravens de Rex Ryan.
Então, para esse exercício basearei a minha defesa moderna no sistema 3-4, sem entrar muito na discussão de por que eu acho o sistema melhor (varia completamente nos jogadores à disposição). Para esse exercício vou tentar mesclar as minhas escolhas individuais entre jogadores no contrato de calouro, um no auge e um veterano. O meu coordenador defensivo seria a melhor mente defensiva da NFL hoje, o “Son of Bum” Wade Phillips.
A parte fundamental da defesa é a qualidade dela em criar pressão. Se ela não consegue vencer o duelo contra a OL eu garanto que ela não será efetiva, portanto eu vejo a front 7 como o grupo mais importante de um time de futebol americano. Dos homens que alinham com a mão na grama antes do snap, temos talvez a grande diferença nessas defesas modernas. Com a ascensão de nomes como Aaron Donald temos hoje uma valorização bem maior sobre os jogadores que jogam no interior da linha, seja como defensive tackle ou nose tackle. O nome do jogo hoje é polivalência. A minha previsão é que nos próximos anos teremos um grande numero de jogadores de interior de linha que alinham em várias posições na linha de scrimmage, transformando a posição na mais valiosa das defesas.
Outro fator que favorece o 3-4 é que o coordenador tem a opção de esconder de onde vem o quarto homem do rush, diferente do 4-3 em que quase sempre os quatro homens da DL fazem o rush e em caso de blitz, vem um LB. Outro fator favorável é que com um DT de alto nível, o ataque é forcado a fazer uma cobertura dupla, caso o pass rusher consiga trazer o guard e o tackle para a marcação, o outside linebacker tem um rush livre, até que um momento de hesitação do tackle pode dar o primeiro passo ao OLB que facilita muito o duelo.
Na minha defesa perfeita, a DL constaria de: Aaron Donald, Vita Vea e J.J. Watt. Donald na 3 ou 5 tech (alinhado entre LT e LG – ver imagem acima para entender posicionamentos) tem a capacidade de destruir qualquer jogador de OL na NFL hoje. Donald, do Los Angeles Rams, seria a minha primeira escolha sobre qualquer jogador na NFL hoje. Ele pode se alinhar em qualquer posição na linha e força linhas ofensivas a montar um esquema especifico para bloqueá-lo. Essa polivalência da ao coordenador defensivo liberdade para escolher o matchup entre DL e OL.
J.J. Watt 3 ou 5 tech (sobre o RG e RT) é um dos melhores jogadores defensivos que eu já vi. Mesmo vindo de contusões, acredito que poucos têm a qualidade de atacar a linha que o jogador dos Texans tem. Como 0 tech (sobre o center) meu nose tackle seria Vita Vea, jogador draftado pelos Bucs este ano. Ele tem o tamanho e versatilidade para se destacar em uma defesa moderna. Fora dos primeiros jogos do ano graças a uma contusão e jogando em um esquema que não o favorece em Tampa Bay (4-3), Vea ainda não se destacou, mas veio da Universidade de Washington, onde ele demonstrou polivalência atuando em várias posições da DL. Minha expectativa é que Vea se destaque nos próximos anos como um jogador de Pro Bowl.
Em defesas 3-4 modernas a prioridade tem a tendência de ser atacar o quarterback, às vezes até sacrificando a defesa terrestre. Portanto, uma defesa que deixa os running backs correm com uma média abaixo de 3,5 jardas por carregada tem ótima chance de ser dominante na NFL, mas pra isso os linebackers precisam contribuir. O grupo ideal de OLB traz a agilidade e explosão de um grande EDGE Rusher, sendo um jogador que sabe atuar como como OLB ou defensive end. A principal função é controlar a dinâmica da jogada ofensiva. Se o RB corre aberto e passa por ele com facilidade, a corrida provavelmente irá conquistar bastante jardas. Por isso, o grande OLB tem que ter velocidade para buscar um RB de alto nível, e claro, correr atrás dos QB ágeis de hoje em dia.
Enquanto os DTs atacam os gaps B (entre o G e T) e A (entre o C G), o OLB fica encarregado de atacar as gaps C, que são por fora do tackle. O fator que torna esse esquema mais efetivo é bem simples: caso a pressão venha por fora do pocket, o quarterback tem a opção de simplesmente dar um passo para frente e estender a jogada. Em certos momentos esse passo para frente do pocket elimina o ângulo do jogador defensivo e ele perde muito tempo se recuperando, resultado, facilita para o tackle e QB. Agora quando a pressão principal vem do interior da OL, o pocket desaba muito rápido. O QB tem a opção de recuar ainda mais ou se movimentar para fora do pocket. O problema com essa estratégia é que de uma forma ou de outra ele está se movimentando em direção ao OLB. O tackle perde a opção de somente afastar o jogador e controlar o pocket, precisando vencer o duelo direto ou segurar o adversário.
Existem vários jogadores com capacidade de dominar essa posição caso contem com uma DL dominante. O resultado é que às vezes os times economizam na posição, ou então montam um esquema de rotação de jogadores como os Eagles fizeram ano passado. Mas para o nosso exercício eu vou escolher uma dupla que encaixe perfeitamente nesse sistema. Von Miller é indiscutivelmente o melhor outside linebacker da NFL. Somente Khalil Mack e Jadeveon Clowney chegam ao seu nível hoje, e mesmo assim eu não hesito em falar que Miller é o melhor da posição. MVP do último Super Bowl dominado por uma defesa (o 50, vencido pelo seu Denver Broncos), Miller é o exemplo perfeito de como um pass rusher de alto nível pode tomar conta de uma partida. Oposto a ele eu escolheria seu parceiro de Broncos. Bradley Chubb não foi selecionado com a quinta escolha do draft este ano à toa. O calouro da NC State já demonstra que tem todas as ferramentas para dominar no maior nível do esporte com 6.5 sacks e 1 fumble forçado em 7 jogos.
Eu cresci com a ideia de que a posição de middle linebacker era a mais importante da defesa. Com nomes como Ray Lewis, Brian Urlacher e Junior Seau, a posição era chamada de o “QB da defesa”, porém no esquema 3-4 essa função perde um pouco do “flash”. Eles não precisam ser grandes jogadores e sim jogadores com talentos específicos. Gosto de uma defesa 3-4 com dois tipos de inside linebacker. Um thumper, aquele cara mais forte, que ataca o backfield nos gaps criados pela DL ou que acompanha o running back, com velocidade para correr atrás das jogadas terrestres e tamanho para estufar os espaços criados pela OL. E o outro é um “general”, um atleta que entenda muito bem o jogo, com a capacidade de ler o que o ataque planeja fazer e ajudar a orientar seus companheiros. O general normalmente tem mais responsabilidades em passes curtos pelo meio, com a capacidade de marcar o RB que sai pra receber um passe, e defender contra passes de screen e jogadas de RPO (run pass option), em que o ataque faz uma jogada em que o quarterback tem uma leitura de passe rápido e decide entre lançar a bola ou correr por jardas.
Existem grandes ILBs na NFL hoje como Bobby Wagner e Luke Kuechly. Logicamente que escolheria um dos dois, mas para tentar manter esse exercício mais próximo da realidade, eu vou economizar um pouco nessa posição e escolher dois jogadores menos conhecidos e mais baratos. Para a posição de thumper eu escolheria Avery Williamson, do New York Jets, um dos melhores linebackers contra o jogo terrestre. Williamson tem aquele motor de alto nível para correr atrás do corredores durante toda partida. Destaque absoluto em 2018 na defesa dos Jets, ele não foi utilizado no 3-4 ainda na NFL, mas acredito que tem todas as características para se encaixar no esquema. Meu general seria Blake Martinez, do Green Bay Packers. Ainda sob contrato de calouro, Martinez é a peça mais importante da defesa dos Packers. Ele é um máquina de tackles e um ótimo aluno do jogo. Já é o jogador que chama as jogadas defensivas no time, tudo isso em três anos, imagina quando ele tiver mais experiencia no currículo? Não preciso pensar duas vezes antes de escolher quem eu queria para a posição hoje.
Um setor do campo que tem muito mais liberdade com um front 7 de alto nível é a secundaria. Com um pass rush que limita o tempo em que o QB tem para definir a jogada e força erros de decisões e passes apressados, a secundária só precisa ter inteligência na hora do snap e é favorecida por jogadores com qualidade para antecipar jogadas. Compartilho do raciocínio de Wade Phillips para os cornerbacks, jogadores que preferem jogar em marcação homem a homem do que em zona, e com a fome de interceptações para levar um passe errado para o outro lado do campo. O grupo de CBs precisa de três jogadores de alto nível, dois de marcação individual e um nickel, aquele entre em pacotes com jogadores extra na secundária, normalmente sobre o slot.
A única posição em que eu gosto de ter jogadores excêntricos e falastrões é exatamente na posição de CB. Acredito que o cara precisa ter um pouco de loucura e autoestima extrema para poder ter a confiança de que um Antonio Brown ou um Odell Beckham não vai te queimar a cada jogada. A escola Deion Sanders da posição. Portanto você provavelmente já sabe quem seria minha primeira escolha. Jalen Ramsey, do Jacksonville Jaguars, começou o ano de forma completamente ridícula e absurda pelos comentários que ele fez detonando praticamente todos os quarterbacks e alguns outros jogadores da liga, mas para alinhar mano a mano com os melhores wide receivers da NFL, ele é a solução ideal. Seu parceiro do lado oposto é outro jogador extremamente polêmico, porém, lance um passe errado perto de Marcus Peters, hoje nos Rams, e ele o retorna para seis pontos. Não é à toa que Wade Phillips não teve receio em apostar no ex-jogador dos Chiefs. Meu nickel corner seria Nickell Robey-Coleman, também do time de Los Angeles, jogador que para a função específica tem se destacado nos últimos anos.
A NFL parece estar desvalorizando os safeties nos últimos anos, com vários jogadores de destaque ficando um bom tempo na free agency e nenhum recebendo uma extensão milionária. Os clubes parecem apostar na juventude. As funções dos safeties na defesa moderna são simples de explicar, mas complicadas de executar. Enquanto os CBs normalmente alinham no mano a mano, os safeties entram no Cover 1 ou Cover 2, ou ficam os dois marcando em zona. O strong safety na meia distância e o free safety como a cobertura longa. Aquela função do ILB de ler o ataque também cabe ao FS na secundária. Com a importante função de tentar decifrar o que o quarterback fará com a bola e providenciar suporte aos corners. Um bom FS antecipa a bola do QB e um ruim erra na leitura (ou é enganado por um bom QB) e deixa a secundária exposta. O strong safety tem uma função diferente. Contra ataques que utilizam bastante do tight end, ele pode ser o homem encarregado de anular o TE ou um blitzer extra.
No meu ponto de vista, a prioridade do FS é ler a defesa e antecipar o passe. E o SS tem que ser um ótimo tackler, aquele que dá uma pancada em que o recebedor fica com receio de passar perto dele na próxima jogada. Hoje a NFL tem algumas duplas de destaque e algumas promissoras, mas uma se destaca acima de todas e eu não mexeria na sintonia dos dois. Harrison Smith e Andrew Sendejo fazem tudo que exigimos da dupla de safeties bem feita. E os dois do Minnesota Vikings ganhariam as ultimas vagas no meu time.
O resultado final não traz aqueles que são os melhores nas suas posições individuais e sim aqueles que eu acredito se encaixam melhor na minha defesa ideal. Ficou assim:
DT: Aaron Donald e JJ Watt
NT: Vita Vea
EDGE (OLB): Von Miller, Bradley Chubb
ILB: Avery Williamson, Blake Martinez
CB: Jalen Ramsey, Marcus Peters, Nickell Robey-Coleman
SS: Andrew Sendejo
FS: Harrison Smith
(Foto: Divulgação / Los Angeles Rams; Dustin Bradford e Logan Bowles/Getty Images)
*Por Raphael Fraga – comentarista de NFL para o USA na Rede e radialista para a Nossa Rádio USA em Boston. Me siga pelo Twitter @Fragafootball.
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