ANÁLISE: Montando o ataque ideal para a NFL moderna
Após sucesso de nossa 'defesa moderna', montamos aquele que seria o melhor ataque para a NFL atual
Há algumas semanas utilizei esse espaço para montar uma defesa ideal da NFL moderna. Nesta semana, como prometi e depois de muitos pedidos, vamos repetir o exercício no outro lado do campo e montar nosso ataque ideal. Antes de qualquer coisa gostaria de deixar bem claro que as opções selecionadas não refletem quem eu acredito que são os melhores nas posições necessariamente e sim o time taticamente ideal para o estilo de jogo imaginado e que possivelmente caberia em um salary cap. Com isso em mente vamos começar com o esquema.
Hoje na NFL podemos enxergar uma revolução ofensiva. Jogos com um número altíssimo de pontos são comuns, e a bola voa como nunca. Isso é um reflexo do que acontece hoje no jogo de college. Treinadores da NFL tem começado a implementar ataques “spread”, que abrem o jogo com vários recebedores e leituras mais simplificadas para acelerar a adaptação dos jovens QBs à liga. O resultado são times que passam a bola muito mais do que temos visto nos últimos anos. A NFL de 2018 está dividida entre a nova geração de treinadores ofensivos liderados por Sean McVay e Kyle Shanahan e a velha guarda dos gênios no ataque, em Andy Reid e Sean Payton. Independente da sua preferência, são treinadores inovadores e agressivos que não hesitam em alterar seu ataque e experimentar novas estratégias e tendências.
Os grandes ataques da NFL hoje variam bastante em estilo, porém contam com alguns fatores que fazem toda a diferença: velocidade, inteligência e o fator coringa de poder esconder várias jogadas diferentes no mesmo grupo de jogadores em campo. Não que isso seja algo novo na liga. O “Greatest Show on Turf” do então St. Louis Rams de 99-2001 (considerado um dos melhores ataques na história da NFL) era mestre disso. Mike Martz, que foi considerado o jovem gênio ofensivo da NFL na época, criou um ataque que era simplesmente mais rápido do que todas as defesas da NFL. Com jogadores de alto nível e polivalentes como Isaac Bruce, Tory Holt e Marshall Faulk, os Rams alinhavam em uma formação e alteravam as posições de seus jogadores várias vezes antes do snap, confundindo a marcação defensiva.
Nos últimos anos tivemos Shanahan aperfeiçoando jogadas do pacote “20 personnel” em Atlanta, que contava com 2 RBs polivalentes e 3 WRs, confundindo defesas sobre qual RB carregaria a bola, recebia o passe ou se a bola iria para um wide receiver. Estratégia aperfeiçoada por Payton nos Saints dos últimos anos. O ano de 2017 popularizou os RPOs em Philly. RPO, pra quem não sabe, é Run Pass Option, quando o quarterback roda uma jogada com opção de passar a bola ou deixar o running back correr com ela dependendo de uma leitura defensiva, algo muito comum no jogo universitário. Os Rams de McVay tem “inovado” com o fato de quase sempre jogar no pacote “11 personnel”, em que o ataque alinha com 1 RB, 1 TE e 3 WRs, pacote básico no esporte, porém correndo a grande maioria do ataque nesse mesmo pacote facilita o “No Huddle Offense” do time, e não permite a defesa a fazer substituições, limitando e cansando as opções defensivas.
Sem mais delongas, vamos começar a montar nosso time.
(Foto: Tom Szczerbowski/Getty Images)
LINHA OFENSIVA
Todo grande ataque começa com linha ofensiva. Sem OL o ataque não rende, independentemente do nível do restante do time. E claro que um grande quarterback é aquele que sabe das limitações da sua OL, e não prende muito a bola. Com o tempo e ritmo entrosado, um bom QB eleva o nível da sua OL. Porém é aqui que eu acredito que não vale apena economizar dinheiro, ainda mais com a dificuldade recente de acertar em jogadores de OL nos primeiros rounds do Draft.
A posição considerada a mais importante da OL e a de left tackle. O LT normalmente enfrenta o melhor pass rusher da defesa e tem a importante função de proteger o blind side ou lado cego do QB. Como grande maioria dos quarterbacks são destros, ele acaba ficando de costas para o lado esquerdo e por isso não enxerga o rush, por isso o LT tem tanta importância. Para a posição eu escolheria o veterano Andrew Whitworth, do Los Angeles Rams. Whitworth não é o melhor LT da NFL, porém não o escolho somente pela qualidade. Em 13 anos de NFL, ele não sofreu uma contusão séria. A consistência dele é o que o eleva acima dos demais, porém é sua liderança que mais me intriga. Contratado pelos Rams em 2017, ele imediatamente elevou o nível do seus companheiros. Fator importante nos ataques modernos são os passes de screen. Acompanhe os passes laterais dos Rams e verá: ágil para o seu tamanho, é comum ver Whitworth saindo para bloquear e abrir espaço para seu companheiro bem adiante da linha de scrimmage.
Para left guard a minha escolha é o melhor jogador do último Draft. Não estou falando de Baker Mayfield, Sam Darnold, Saquan Barkley, etc… o melhor calouro de 2018 é Quenton Nelson. O guard ex-Notre Dame imediatamente melhorou uma das piores OLs da NFL, a do Indianapolis Colts. Com força e velocidade acima da média, Nelson é o melhor G a entrar na NFL desde de Zack Martin (Dallas Cowboys). Arrisco dizer que ele tem potencial para um dia chegar no Hall da Fama.
Right guard talvez foi a posição que eu mais sofri para escolher o jogador ideal. Minha dúvida ficou entre o próprio Martin, citado acima, e David DeCastro. No final, optei pelo veterano do Pittsburgh Steelers, que traz o mesmo estilo de liderança de Whitworth para a linha pelo lado oposto. Ótimo em abrir espaço para o jogo terrestre e na proteção para o passe, DeCastro sempre me lembrou Alan Faneca, outro grande G dos Steelers que deve estar entre os finalistas para entrar no HoF este ano, um índice do futuro de DeCastro.
Para center minha opção seria Travis Frederick, dos Cowboys, mas a doença que o tirou da temporada ainda causa dúvidas sobre o futuro dele na NFL. Minha segunda opção, primeira neste momento, é Jason Kelce, do Philadelphia Eagles. O center é um dos fatores importantes no desenvolvimento de Carson Wentz. Um C experiente ajuda muito o jovem QB na leitura pré-snap. Pela energia contagiante que ele traz a uma OL, Kelce provavelmente seria um dos capitães do meu time.
Para a última posição da linha ofensiva, eu vou com outro jogador no seu contrato de calouro. Ryan Ramczyk, do New Orleans Saints, como right tackle. Ramczyk se destaca em uma classe de calouros de New Orleans, que ainda conta com Alvin Kamara e Marshon Lattimore. Ele traz qualidades físicas semelhante a Whitworth e foi a última peça em um reformulação agressiva na OL dos Saints nos últimos anos que a transformou em uma das melhores se não a melhor da NFL em 2018 – não podia faltar um Saint nessa lista.
(Foto: Joe Robbins/Getty Images)
RUNNING BACKS
Segunda parte decisiva na formação de um ataque, talvez a posição mais desrespeitada financeiramente na NFL nos últimos anos. Os contratos longos e milionários tem sido raros para running backs graças a facilidade de encontrar ótimas opções nos Drafts recentes. Porém com uma OL dominante e um bom RB, uma equipe tem a opção de controlar a posse do jogo e o quanto tempo o adversário fica em campo.
Um fator importantíssimo para RBs modernos é a qualidade de abrir e receber passes. Com um jogador perigoso no jogo aéreo, a defesa é sempre forçada a respeitar a arma no passe curto e abre o leque do play action para o ataque. O time também ganha a opção de tirar o RB do backfield e o alinhar como WR dependendo da leitura defensiva antes do snap.
Acredito que o melhor running back da NFL hoje é indiscutivelmente Todd Gurley, mas como ele recebeu uma extensão milionária este ano, optarei por opções mais baratas aqui. Sim, com RBs dentro do contrato de calouro teríamos a opção de investir em dois de alto nível. Abrindo as opções ofensivas como os Saints e Falcons fizeram tão efetivamente nos últimos anos.
Minha primeira escolha é Kareem Hunt. Líder de jardas no ano passado, ele tem força e velocidade para correr entre os guards ou por fora dos tackles. Também trazendo as características de ser um ótimo recebedor, os Chiefs acertaram em cheio com a escolha numero 86 do Draft de 2017. Hunt é o protótipo de um RB perfeito para a NFL de hoje em dia.
Minha outra opção (não segunda porque vejo os dois no mesmo nível) seria Alvin Kamara. Outro jogador do terceiro round de 2017, Kamara é simplesmente um monstro no back field dos Saints. Extremamente explosivo e elusivo, tem a qualidade para explodir a qualquer momento para a end zone. Vejo Kamara como o RB mais explosivo da NFL hoje.
(Foto: Reprodução Twitter/Kansas City Chiefs)
TIGHT END
Antes de revelar a minha escolha para a posição mais popular do esporte, vamos escolher as armas que ele teria a disposição. Um grande quarterback sem opções para receber os passes limita consideravelmente seu potencial. Para um jovem QB é interessante ter um cobertor de segurança na posição de TE, alguém que tem a qualidade de correr aquelas rotas curtas pelo meio do campo apresentando uma alternativa mais fácil de passe.
Com tamanho para ir buscar a bola no 20º andar, velocidade para disputar corrida com DBs e as mãos mais seguras da NFL hoje, minha opção fica com o pesadelo de Kansas, Travis Kelce – mais um da família no time. Kelce tem superado Rob Gronkoski nesse ótimo ano como o melhor TE da liga ao lado de Zach Ertz (menção honrosa para ele). Você duvida da importância de Kelce para o esquema explosivo dos Chiefs? Assista aos jogos em que ele se machucou e veja a queda visível do rendimento do time.
(Foto: Reprodução Twitter/Kansas City Chiefs)
WIDE RECEIVER
A posição de wide receiver hoje em dia precisa de jogadores com uma certa polivalência para alinhar em todas as posições e correr rotas variadas, porém também é importante ter algumas armas especificas para a diversão dos jovens QBs e HCs da liga. Separando em três funções especificas, meu WR1 seria aquele que mais incorpora a ameaça do passe longo. Sim, Antonio Brown é o melhor recebedor da NFL hoje. Porém se eu quero montar uma verdadeira maquina ofensiva eu quero aqueles que correm rotas perfeitas em alta velocidade. Meu WR 1 seria Tyreek Hill, dos Chiefs. Ele abre o jogo melhor do que qualquer outro atleta na NFL hoje. O jogador mais veloz na liga força defesas a respeitar o passe longo em todas jogadas em que ele está em campo. Também perigoso nas rotas slants, em que um simples corte para dentro antes da recepção deixa o campo aberto para sua velocidade transformar um passe de 8 jardas em um de 80.
Meu wide receiver 2 é o parceiro de AB nos Steelers. JuJu Smith-Schuster incorpora tudo aquilo que eu gosto de um verdadeiro WR2. Ele tem a velocidade para correr passes longos contra o mathchup defensivo teoricamente mais fácil. O segundo recebedor é aquela opção de segunda leitura do QB, em que sob pressão ele pode simplesmente botar a bola onde o WR supostamente está sem olhar, e ele sempre está lá. JuJu é o complemento perfeito a AB nos Steelers e também complementaria perfeitamente nosso ataque moderno.
O WR 3 seria o slot receiver, aquele que normalmente alinha mais próximo à OL e corre rotas mais curtas pelo meio do campo. Minha opção é Cooper Kupp, dos Rams, que infelizmente se machucou semana passada e desfalcará os Rams pelo restante da temporada. Mas antes da contusão Kupp era o alvo mais seguro de Jared Goff, transformando 3rd downs nos Rams em “3rd and Kupp“. Cooper corre rotas precisas como um veterano da liga. Em seu segundo ano ele já demonstrava um aperfeiçoamento em recepções difíceis e fará falta aos Rams nessa reta decisiva.
(Foto: Reprodução Twitter/JuJu Smith-Schuster)
QUARTERBACK
Agora chegamos à posição de glamour. Quem seria o QB ideal para liderar o grande ataque moderno da NFL? Já adianto que eliminei todos os veteranos. O ideal hoje em dia é montar o time em volta de um QB dentro do contrato de calouro, podendo gastar a grande parte do cap nas peças em volta dele. Só existem três nomes que eu realmente considerei para essa posição nesse cenário: Jared Goff (Rams), Carson Wentz (Eagles) e claro, Patrick Mahomes (Chiefs).
Ano passado a resposta seria claramente Wentz. Com o ano digno de MVP antes da contusão, ele demonstrava habilidade para escapar do pocket e soltar passes magníficos completamente desequilibrado. O QB de Philly sempre me lembrou um jovem Brett Favre. Um cowboy do velho oeste, Wentz tem confiança para lançar a bola em qualquer cobertura. Os números pedem para escolher Mahomes. Em seu primeiro ano como titular, ele tem tido uma temporada comparável às melhores de um QB em toda a história da NFL. Muito mais do que números, Mahomes tem o braço mais talentoso que eu vi na NFL desde Dan Marino. Com força física para ser um QB que sai do pocket e resolve com as pernas, o craque de Kansas City, como Wentz, tem a capacidade incrível de lançar passes sem equilíbrio algum. Pat Mahomes é um talento físico incrível.
Jared Goff tem o estilo diferente dos dois. Ele é mais cerebral, controla o pocket, engana defesas e protege a bola. Se Wentz e Mahomes não hesitam em lançar aqueles passes subatômicos entre coberturas, Goff tem aperfeiçoado a arte de botar a bola onde somente o seu recebedor pode chegar nela. Mas ele é mais do que isso. Não somente protege a bola muito bem, forçando menos INTs do que os companheiros de posição. Goff tem três caraterísticas que o transformam em um verdadeiro QB de franquia. Primeiro, tem demonstrado inúmeras vezes nos últimos dois anos que ele é capaz de completar qualquer passe, seja aquele de arco longo, o míssil baixo pelo meio, aquela bomba para o WR em “curl”. A variedade de passes que ele consegue completar é incrível, porem o que Goff faz melhor do que os dois é a antecipação; consegue lançar a bola antes do WR completar a rota de uma forma em que ela chega onde ele vai estar, de uma forma que quando o companheiro virar a cabeça a bola já está chegando em seus braços.
Outro fator é a inteligência do jogo. Isso vem desde a faculdade. Goff tem a capacidade mental de entender o jogo, ler a defesa e alterar a chamada. Claro que tendo McVay no seu ouvido ajuda, mas como o próprio técnico já falou inúmeras vezes, seria impossível fazer o que os Rams fazem sem que o QB entenda perfeitamente a jogada e os detalhes minuciosos que a fazem funcionar. E por último, esse talvez seja o grande fator que faz toda a diferença, o sangue frio. Como o primeiro verdadeiro freshman QB titular dos Golden Bears, Goff terminou o ano universitário com somente uma vitória, porém em três anos, ele encerraria seu ciclo em Cal com 26 recordes de passes na velha universidade de Aaron Rodgers. Na NFL ele também começou mal, sendo chamado de bust por muitos após a primeira temporada desastrosa com Jeff Fisher nos Rams, em que ele perdeu os sete jogos que atuou como titular. Mas sob o comando de McVay, Goff tem demonstrado uma evolução visível a cada partida. Sem medo de lançar a bola sob pressão, sem medo de receber uma pancada para completar o passe, Goff sempre parece calmo, como se nada o afetasse, característica compartilhada entre os melhores quarterbacks de todos os tempos na NFL.
Confesso que o jogo do Monday Night Footbal da semana 11 foi decisivo na a minha decisão sobre quem seria o QB na coluna desta semana. Uma grande atuação de dois grandes QBs, mas que resumiu bem as características que me fazem escolher Jared Goff. Depois de duas semanas conturbadas de Los Angeles por fatores extracampo, diante da confusão da semana na troca do local onde o jogo seria disputado, Goff mais uma vez apresentou uma grande atuação diante de circunstâncias adversas, com 4 touchdowns pelo ar e um pelo chão, 413 jardas e 63,3% de precisão nos passes. Goff teve seu pior momento quando sofreu um fumble recuperado na end zone no último quarto do jogo, dando a virada para os Chiefs, e respondeu com um drive magnifico de 75 jardas em 6 jogadas, incluindo um passe de antecipação maravilhoso para Woods e outro apertado na end zone para Everett. Mesmo assim, em um último quarto em que nada parecia dar certo para o ataque dos Rams, após mas uma virada dos Chiefs, Goff liderou os Rams a mais um drive sensacional e completou um passe perfeito para o último TD do jogo e a eventual vitória de sua equipe. Sem sentir a pressão do momento, sem se intimidar com o fumble, elevando seu jogo em grandes momentos.
Jared Goff pode não ser o melhor quarterbacks da liga hoje, mas a cada TD, a cada vitória, a cada passe milimetricamente perfeito, vai demonstrando sua evolução que parece não ter fim, e no meu ponto de vista tem o potencial para ser um dos grandes QBs na história da NFL. Goff é o QB perfeito para comandar um ataque que utiliza todas as armas à disposição, que não entrega turnovers, e que consegue compreender e executar um ataque complexo e de alta velocidade requerido para dominar a NFL moderna.
(Foto: Kevork Djansezian/Getty Images)
O ATAQUE IDEAL DA NFL MODERNA
LT: Andrew Whitworth (Rams) LG: Quenton Nelson (Colts) C: Jason Kelce (Eagles) RG: David DeCastro (Steelers) RT: Ryan Ramczyk (Saints)
QB: Jared Goff (Rams)
TE: Travis Kelce (Chiefs)
RBs: Kareem Hunt (Chiefs) e Alvin Kamara (Saints)
WR1: Tyreek Hill (Chiefs) WR2: Juju Smith-Schuster (Steelers) WR3: Cooper Kupp (Rams)
*Por Raphael Fraga – comentarista de NFL para o USA na Rede e radialista para a Nossa Rádio USA em Boston. Me siga pelo Twitter @Fragafootball.
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