[TP ENTREVISTA] Do Brasil para o college football: Marcelo Bonani, kicker de Missouri State
Kicker brasileiro no FA universitário fala sobre sua relação com o esporte, com o Brasil e com o irmão Maikon Bonani
Não é segredo pra ninguém que o futebol americano vem crescendo cada vez mais no Brasil. As partidas transmitidas pelas emissoras brasileiras vêm obtendo audiências cada vez maiores, a prática da modalidade vem se difundido pelo território nacional e, no ano passado, pela primeira vez, um brasileiro atuou na temporada regular da NFL: Cairo Santos, pelo Kansas City Chiefs.
Neste contexto, uma família em especial simboliza bem a popularização da bola oval em solo verde-e-amarelo. A família Bonani mudou-se há mais de 10 anos para os Estados Unidos, mas não perdeu as ligações com o Brasil e, de quebra, os dois primogênitos ainda denotam como os brasileiros vêm pedindo cada vez mais espaço não só fora de campo, como também dentro dele.
Maikon e Marcelo Bonani foram ainda crianças para a terra do tio Sam. Lá, impulsionados pelo futebol da bola redonda, conheceram o futebol americano, se tornaram kickers e, assim, ganharam destaque desferindo outros chutes sobre uma bola diferente. Enquanto Maikon foi o primeiro brasileiro a chegar a NFL (jogou pré-temporada pelo Tennessee Titans, porém não entrou no elenco da temporada regular), Marcelo, seu irmão, encontra-se na sua última temporada no college football, o futebol americano universitário, e jogando pela universidade de Missouri State, que integra a FCS (Football Championship Subdivision, divisão esta com os programs de segundo escalão) da NCAA, vem obtendo destaque também.
Apesar de menos conhecido que o irmão, Marcelo conta com uma carreira interessante dentro do futebol americano. Em seus tempos de colegial, chegou a ser considerado um dos melhores kickers do estado da Flórida e, posteriormente, na universidade, chegou a integrar o elenco de Florida Atlantic, porém, em 2012, transferiu-se para Missouri State, onde consolidou-se como principal kicker na última temporada quando marcou 12 field goals de 17 tentados (com direito a um de 53 jardas que deu a vitória aos Bears contra Central Arkansas), além de ter convertido 29 extra-points dentre 32 tentativas.
Em entrevista exclusiva ao The Playoffs, concedida por email, Marcelo Bonani comentou sobre a vida nos Estados Unidos, a carreira no futebol americano, o relacionamento com seu irmão, as expectativas perante a temporada 2015 junto a Missouri State Bears, e, também, sobre o crescimento da modalidade no Brasil. E, claro, também demonstrou todo seu carinho pelo seu país-natal, não deixando de ressaltar a paixão pelo nosso churrasco.
The Playoffs: Quando você demonstrou interesse pelo futebol americano? Desde sempre, cogitou levar o esporte a sério?
Marcelo Bonani: O futebol americano entrou em minha vida quando meu irmão mais velho Maikon Bonani começou a atuar como kicker em seu colegial. Quando eu cheguei aos Estados Unidos, nós pensávamos que o esporte era esquisito, nós costumávamos dizer: “por que estas pessoas estão usando capacetes e derrubando umas às outras?”. Mas, uma vez que meu irmão conseguiu uma bolsa de estudos integral na Universidade de South Florida, foi quando comecei a me dedicar nisso.
The Playoffs: Com 8 anos, você já acabou se mudando para os Estados Unidos. Apesar de ter vivido pouco tempo no Brasil, guarda alguma recordação em relação ao país?
Marcelo Bonani: Com certeza! Eu amo meu país (Brasil), tento visitá-lo uma vez por ano para ver minha família e meus amigos. Tenho muitas lembranças do Brasil, algumas de antes de me mudar para os Estados Unidos, outras do que vivi nas minhas visitas por aí.
The Playoffs: Existe algo da cultura brasileira que seja especial para você?
Marcelo Bonani: Eu me considero brasileiro! Eu tento ser altruísta, tento ajudar as pessoas o máximo que posso, e tenho muito orgulho disso! Os brasileiros são humildes, nós adoramos ajudar o próximo. Além disso, eu também trago comigo muitas receitas brasileiras! Meus pais me ensinaram a cozinhar quando eu ainda era bastante jovem. E nada é melhor do que nosso arroz e feijão e nossas tradicionais carnes. Não tem como não amar nosso churrasco! Quando convido amigos e companheiros de equipe para comer, eles se deliciam!
The Playoffs: No high school, você chegou a jogar pela equipe de futebol da sua escola. O futebol chegou a te ajudar em algo no futebol americano? Ou era tido mais como um meio de diversão?
Marcelo Bonani: No high school, eu joguei futebol, tênis e futebol americano. O futebol (soccer) é minha paixão até os dias de hoje, mas é difícil ganhar bolsas de estudo por ele. Acredito que ter jogado futebol desde cedo foi vital para o aprimoramento de meus chutes. O futebol nos dá coordenação entre os olhos e os pés, o que influenciou nas minhas habilidades como kicker. Além do mais, ele continua sendo um esporte que eu levo como hobby e que pretendo jogar por algum time local depois de me formar.
The Playoffs: Ainda falando sobre sua carreira no high school. Você se consolidou como um dos principais kickers do estado da Florida. Isto te deu mais confiança ao chegar ao futebol americano universitário?
Marcelo Bonani: Sem dúvidas me deu mais confiança, mas meus pais e meu irmão sempre me instruíram para manter os pés no chão, porque o fato de figurar entre os melhores kickers do estado coloca uma pressão muito grande sobre o atleta. Eu odeio desapontar as pessoas, o que inclui minha família, técnicos, amigos, companheiros de equipe. Tendo isso em vista, ser rotulado dessa maneira faz você levar as coisas mais a sério, então realmente acredito que me deu mais confiança e me motivou no college football.
The Playoffs: Sua carreira no futebol americano universitário começou em Florida Atlantic, contudo, você disputou apenas uma temporada por tal universidade. O que te motivou a transferir-se para Missouri State?
Marcelo Bonani: Meu caminho em Florida Atlantic foi curto, mas chama a atenção. Depois do meu primeiro ano, nós tivemos uma mudança na comissão técnica. O novo técnico tirou minha bolsa de estudo por motivos que até hoje não entendo. Desta forma, eu cheguei ao que eu acredito ser o ponto mais baixo de minha carreira atlética. A depressão bateu e eu não sabia o que viria a seguir, nunca me senti tão fracassado em toda minha vida.
Sou muito grato à minha família e aos meus amigos por terem me tirado desta. Também agradeço ao meu técnico em Florida Atlantic que contatou meu ex-técnico daqui (Mike Chandler) e que mandou à Missouri State meus DVDs, o que levou eles a me recrutarem em seguida. Sem dúvida foi a melhor mudança que poderia ter acontecido comigo.
The Playoffs: De acordo com as regras de transferências da NCAA, depois de se transferir de uma universidade para outra, você se vê obrigado a ficar um ano sem jogar. Como foi passar este tempo apenas treinando?
Marcelo Bonani: Como eu me transferi uma divisão abaixo, eu estava apto a jogar. Fiquei feliz por ter tido um redshirt year (ano em que o atleta acaba designando a não competir em jogos, apenas treina com a equipe) que me permitiu permanecer focado nos treinos. Sou muito grato por ter contado com Austin Witmer como companheiro de equipe, visto que ele sempre se mostrava solícito e nós motivávamos um ao outro para se tornarmos melhores kickers.
The Playoffs: Em 2013 e 2014, você foi ganhando cada vez mais espaço nos Bears. Quais suas expectativas para a temporada de 2015?
Marcelo Bonani: Os Bears estão prontos para vencer! Estamos treinando forte e estamos aptos para competir nesta temporada.
The Playoffs: Seu irmão, Maikon Bonani, também se aventurou como kicker e, inclusive, chegou a fechar contrato com uma equipe da NFL. Como é a relação entre vocês dois? Ele busca te aconselhar quanto ao futebol americano?
Marcelo Bonani: Meu irmão é meu modelo de comportamento e mentor, não só na vida, como nos esportes. Como criança, nós não nos dávamos muito, mas nossa ligação veio com o colegial e o esporte na universidade. Na minha opinião, nossa relação é perfeita, nós estamos sempre acompanhando um ao outro. A qualquer hora que eu tiver problemas com os chutes ou com a vida, ele está a uma ligação de telefone de distância. Ele é o melhor técnico da vida e de chutes que eu poderia ter.
The Playoffs: Seu irmão ficou muito perto de atuar na temporada regular da NFL e, no ano passado, o Brasil contou com o também kicker Cairo Santos atuando na liga pelo Kansas City Chiefs. Espera alcançar este patamar?
Marcelo Bonani: Se eu tiver essa oportunidade, certamente vou aproveitá-la.
The Playoffs: Nos últimos anos, o futebol americano vem crescendo muito no Brasil, com a TV tendo grandes audiências tanto com os jogos da NFL como do college, além do mais, muitas pessoas vêm se interessando por jogar futebol americano por aqui. Qual a sensação de ver esta crescente?
Marcelo Bonani: É maravilhoso ver isso acontecer. O futebol americano é um esporte que ensina o trabalho em equipe como nenhum outro. Para ganhar, você realmente precisa trabalhar em sintonia com seus companheiros, como se fossem um só. Ver o futebol americano crescer no Brasil me deixa extremamente feliz.
Contribuiu: Rodolfo Quaggio