[ENTREVISTA] Paulo Orlando: “Se não for nos Royals, vou buscar meu espaço em outro lugar”
Em entrevista exclusiva ao The Playoffs, brasileiro sonha com bicampeonato e titularidade, mesmo se for em outro time
SÃO PAULO (SP) – Num belo estúdio de tatuagem localizado no bairro de Santana, em São Paulo, encontramos nesta semana ele que, depois de dez anos lutando nas Ligas Menores, conseguiu um lugar ao Sol na MLB. E logo em seu primeiro ano, foi campeão. Paulo Orlando, senhoras e senhores. O objetivo, ali, era fazer uma nova tatuagem, claro, relembrando os feitos dele na temporada 2015, no Kansas City Royals. Na pele, ele gravou a cena da rebatida que virou um walk-off grand slam, no ano passado. “São poucos que podem registrar uma tatuagem com essa”, brincou.
Mesmo com o título, Paulão, como é conhecido entre os amigos, é o mesmo das primeiras rebatidas da carreira, nos campos de São Paulo. Em vez de deixar o sucesso subir à cabeça, ele planeja voos maiores, pois sabe que nada está ganho. E em entrevista exclusiva ao The Playoffs, dias antes de se apresentar ao Spring Training dos Royals, deixou claro que pensa até em mudar de time se precisar buscar seu próximo objetivo, que é ser titular. “É lógico. É uma meta. Então, este ano eu vou brigar por estar entre os 25 de novo, depois brigar pela vaga [de titular]”.
No bate-papo, o outfielder ainda falou das perspectivas para 2016, da concorrência no elenco, do desejo de jogar a Eliminatória do World Baseball Classic em setembro e do momento do beisebol no Brasil. Confira!
THE PLAYOFFS – Com vários feitos na última temporada, participação importante defensiva nos Playoffs da última temporada e um reconhecimento bem legal aqui no Brasil. Quais são os próximos passos para você na temporada que está por começar?
PAULO ORLANDO – Não só nesta temporada, mas para as próximas, espero me firmar. Essa é minha meta. Claro que na primeira temporada, ter chegado e já ter sido campeão, você fala “caramba”. É um fato inédito mesmo. Uma coisa que muitos jogadores tentaram por anos e não foram nem às finais. Mas eu espero que nesta temporada eu me firme de vez.
O que esperar do Kansas City Royals em 2016, agora campeão e muito mais visado?
Os Royals perderam alguns jogadores importantes que chegaram no meio da temporada [Johnny Cueto e Ben Zobrist, por exemplo], mas acho que reforçou a parte de arremessos, então acho que não vai diferenciar muito o jogo da equipe pra este ano em relação ao ano passado. Então os Royals ainda têm força pra lutar e defender este título. E claro, espero estar no time principal e ajudar.
Você espera brigar por uma vaga no time titular nesta temporada?
É lógico. É uma meta. Então, este ano eu vou brigar por estar entre os 25 de novo, depois brigar pela vaga [de titular]. É claro, como são muitos jogos então não é só você o titular. A gente tem outros jogadores de qualidade [na posição de outfield], que são rebatedores canhotos, que podem ter uma possibilidade melhor de rebatida contra arremessadores destros… mas é a minha meta. Todo mundo fala que no beisebol não é só chegar. Tem que chegar e se firmar. Mas espero estar entre os 25 e depois brigar pela posição.
Alex Gordon quase deixou os Royals nesta offseason, o que teoricamente seria uma boa pra você, já que é um concorrente de posição. No fim, renovou o contrato. Você acompanhou estes rumores, tava esperando por esta negociação? Como foi?
Coisas do beisebol. Beisebol é assim. Se não for com o time dos Royals, vai ser com outro time, sabe? Vou buscar meu espaço, fazendo o que eu sei fazer. Aproveitar as oportunidades que eu tenho de jogar, vou demonstrar meu beisebol e… claro, são 30 times pra jogar e buscar uma afirmação na Major League. O Gordon é um jogador super estrela, luva de ouro e tudo mais. então é sempre bom se estiver no time dele pra gente ganhar, ganhar campeonatos. Mas eu não penso nisso de ser competitivo com o grupo porque podem ter outros times aí que podem me contratar.
No ano passado chegou a ser especulado que os Royals poderiam te trocar. Isso então passa na sua cabeça? Você acha que seria algo bom para buscar mais oportunidades, já que você tem uma grande concorrência na sua posição dentro do time?
Quem especula diz que é bom pra mim. Porque eu mostrei que tenho qualidade, que poderia ajudar, que poderia ser titular em outro time. Mas eu sou dos Royals. Eles têm certa visão sobre mim, sobre meu jogo. Tenho que esperar a oportunidade aparecer para demonstrar como titular, ou entre os suplentes, em momentos que tenho que entrar no jogo, seja na defesa, correndo uma base. Vou continuar fazendo meu trabalho e, se não for nos Royals, seria bacana também em outro time buscar meu espaço.
Como é sua relação com seus concorrentes de posição no campo externo?
A relação tem que se profissional sempre. Nas Ligas Menores a competição pra buscar uma vaga [na MLB] já é difícil. Então quando você chega nas Grandes Ligas você tenta fazer o máximo no seu trabalho. Eles mesmo falam lá pra não desejar o mal pra algum jogador pra ter a sua oportunidade, e sim, quando a oportunidade aparecer, um jogador tiver descanso, que apareça um jogador que supra ali no momento e faça o trabalho como ele [titular] poderia ter feito. Então o relacionamento é profissional. Você chega no estádio, fazemos nosso trabalho, cada um faz o seu. Isso faz com que o time também se una. Não é uma coisa do tipo “vou lá, fazer meu trabalho e não vou falar com ninguém”. Você busca informações, no beisebol em cada jogo você encontra alguma coisa pra aprender. Então fazer uma pergunta pra outro jogador não é nada demais. Não é pensando que se responder ele vai querer ganhar minha posição. No beisebol são situações diferentes ali na hora do jogo, que uma pergunta ou outra, uma informação faz com que o time se una e ganhe os jogos.
Quem são os companheiros de equipe mais próximos? Tem um grande amigo no elenco?
O tempo é curto, né?! Vai pro estádio e vai pro hotel. Então, assim, a gente não tem muito tempo, a gente busca mais um tempo pra descansar mesmo. Mas tem um jogador que era mais próximo que é o Christian Colon (infielder porto-riquenho). Sempre que precisava de alguma coisa, de uma carona, ele tava ali perto. Minha esposa conheceu a esposa dele, a filha dele. Ele viveu a mesma situação que a minha, praticamente, de ter chegado nas Grandes Ligas há pouco tempo, então a gente se apega mais do que os veteranos, que tão com a vida mais feita, que têm todas as condições que qualquer jogador almeja.
Como você vê o momento do beisebol no Brasil hoje? Acredita que seu sucesso foi responsável por impulsionar o esporte aqui em 2015, com sua ascensão e título?
O beisebol vem crescendo bastante. Quando eu voltei o reconhecimento, até por redes sociais foi expressivo, no meu modo de ver. São coisas que a gente vai conquistando. O Yan foi o primeiro, o André em seguida, depois eu cheguei e fui campeão. A gente espera que mais jogadores tenham oportunidade serem contratados, de jogarem nos Estados Unidos, se tornarem profissionais e alcançarem o objetivo de chegar nas Grandes Ligas, que com isso os olhos do público do Brasil vão estar mais voltados [pro beisebol]. E isso é possível, tem muitos jogadores que podem sair daqui e realizar um sonho. E a Major League vem ajudando e vendo toda essa evolução do Brasil no beisebol mundial e que com isso possam investir aqui no Brasil, pra que o público também acompanhe mais de perto.
Os três brasileiros que chegaram à MLB não foram apontados, no passado, como grandes prospectos. O Luiz Gohara é, segundo alguns, o 2º melhor jovem dos Mariners. Você tem contato com ele e os demais brasileiros nas minors? Qual a expectativa para essa molecada que está vindo aí?
É meio difícil o contato com eles, ainda por estarem em categorias diferentes. O Gohara por exemplo vem subindo de categoria, é um prospecto e tem tudo pra daqui 1 ou 2 anos chegar nas Grandes Ligas, ainda mais na posição que ele joga, que é arremessador. O Leo (Leonardo Reginatto, shortstop do AAA do Minnesota Twins) também tá na batalha, agora vai ter a oportunidade para jogar em outro time (deixou o Tampa Bay Rays recentemente). É difícil o contato direto com eles, mas sempre uma mensagem ou outra, acompanhar pelo menos os números, que é algo que os americanos veem bastante. Independente da categoria que eles joguem, se tiverem bons números eles vão subir de Liga no meio da temporada. Sempre que eles fazem um jogo bom, eu mando mensagem pra eles, é assim que a gente tenta conversar. Sobre as situações de jogos é difícil a gente comentar, porque a gente não tá vendo, só está vendo número. Mas eu espero que outro brasileiro venha a ser contratado e entenda esse lado do americano que e dos números, não é só chegar, pegar a bolinha e rebater, fazer uma jogada que ele vai subir de categoria.
O que o Paulo Orlando, individualmente, precisa melhorar nesta temporada? Que fundamento ou número?
Com mais jogos e mais ritmo de jogo, jogos seguidos, tem o average (aproveitamento de rebatidas). Você tem que se manter ali numa porcentagem boa, é isso que eles contam mais (Paulo teve 24,9% em 2015, na temporada regular). Tem outras situações também, como roubar base, que são números que você pode se manter ali na liga principal, só pra entrar e roubar base. Então tudo depende da habilidade que você tenha, a qualidade que você mostra pra ficar no time principal.
A Eliminatória do Brasil no WBC foi marcada para setembro e, com isso, você possivelmente não estará em campo. Mesmo sem vocês da MLB, somos favoritos contra Paquistão, Israel e Grã-Bretanha? Você pretende jogar a fase mundial, se o Brasil garantir vaga?
Não tem nada certo ainda que vou poder ir ou não [para a Eliminatória]. Tudo depende de como Kansas City vai estar na Liga. É em setembro que a maioria dos times sobe seus jogadores do roster 40-man, então vão ter bastante jogadores ali. Se tiver uma liberação, eu quero estar, já deixei bem claro para a comissão técnica do Brasil. Acho que é um mês que não vai influir muito, que eu não vou ter que estar lá nos Royals, então uma liberação seria importante e espero ajudar o time. Com os jogadores que temos agora, temos uma certa experiência por termos participado do último clássico, a gente pode fazer um bom trabalho e classificar novamente pra fase final.
Como é sua relação com o Cairo Santos (brasileiro do Kansas City Chiefs, da NFL)? Como a mídia local repercute o seu trabalho e o dele?
Tive a oportunidade de conhecer o Cairo. Ele foi no estádio [do Kansas City Royals] na pré-temporada deles, porque às vezes não coincide a temporada nossa com a temporada deles, quando estamos em um lugar ele está em outro estado. Quando ele foi lá a imprensa também foi, registrou, ele fez uma visita lá. Ele até foi mais assediado pelos nossos jogadores que acompanham a NFL, porque o futebol americano é o principal esporte, mais acompanhado nos Estados Unidos. Mas foi legal ter conhecido ele, saber que ele é brasileiro e também está fazendo sucesso na mesma cidade onde eu comecei a abrir minhas portas. Depois não encontrei mais ele, mas pretendo reencontrá-lo quando voltar e dar os parabéns pela temporada que ele teve.
Com os Jogos Olímpicos do Rio chegando, em algum momento passou pela sua cabeça um filme de o que poderia ter ocorrido caso você tivesse continuado no atletismo?
Eu tive a oportunidade de ter pensado isso em 2007, naquela ocasião no Panamericano (no Rio de Janeiro). Meu técnico estava me preparando no atletismo pra eu estar nesse Pan. Eu tinha acabado de sair da categoria juvenil. Mas eu sempre tive esse curiosidade no beisebol, sempre quis e sempre gostei do ambiente que tinha aqui no Brasil. E quando meu técnico falou que eu teria oportunidade de ser profissional e jogar nos Estados Unidos aí que minha curiosidade aumentou mais ainda. Naquele tempo eu pensei que se não desse certo no beisebol profissionalmente, eu voltaria pro atletismo e seguiria minha carreira. Graças a Deus eu fiz um bom trabalho e fui pras Ligas Menores, durei muitos anos ali. Ano passado foi o sonho realizado, de chegar nas Grandes Ligas. Esse fato de jogar Olimpíadas ou não, espero é que o beisebol volte [ao programa dos Jogos] na próxima, que vai ser no Japão, e o Brasil tenha um time competitivo para estar lá. No beisebol você pode até jogar mais tempo do que [a carreira] no atletismo. Se eu tivesse seguido no atletismo, já estaria agora quase no fim de carreira. Judia bastante! São esportes diferentes, mas eu vejo que no futebol tem um futuro mais longo.
O que você acha que falta para o Brasil ser de vez um celeiro, um lugar de beisebol?
O que eu vejo, comparando com outros países, é não ter uma liga. Que tenha um estádio adequado, um ambiente não só de final de semana, de lazer. Ter durante a semana também um joguinho, um campeonato, uma torcida, é algo que desperta os jovens que estão em busca também desse esporte. Eu vou de fim de semana e vejo lá um monte de crianças pequenas, 5 ou 6 anos, que gostam do esporte e vão lá pra treinar e aprender. Mas se tivesse uma liga, um estádio, um campeonato, isso mudaria bastante coisa.
(Fotos: Samy Silva/The Playoffs)